Introducción: del activismo a la corporación
Durante décadas, la lucha por la legalización del cannabis fue encabezada por activistas, pacientes, cultivadores comunitarios y colectivos marginalizados. Sin embargo, una vez abierto o regulado o mercado, novos atores entran em cena: grandes empresas, fundos de investimento, conglomerados farmacêuticos e figuras políticas convertidas em empresários. Neste contexto, é essencial perguntar: quem está realmente se beneficiando da legalização do cannabis?
Legalização sem justiça: uma tendência global
Em muitos países que avançaram na regulação do cannabis, observamos um padrão preocupante: o mercado legal é rapidamente capturado por grandes empresas com acesso a capital, influência política e infraestrutura legal. Enquanto isso, os usuários tradicionais e cultivadores comunitários enfrentam barreiras legais, econômicas e burocráticas para se formalizar. Assim, a legalização pode acabar reproduzindo desigualdades em vez de repará-las.
Barreiras de entrada: um mercado para poucos
Entre os obstáculos que excluem pequenos produtores e comunidades vulneráveis, destacam-se:
- Altos custos para obtenção de licenças
- Exigências técnicas e sanitárias inacessíveis para agricultores familiares
- Criminalização anterior como impedimento para operar legalmente
- Falta de apoio técnico e acesso a crédito para empreendimentos populares
A “legalização” acaba sendo, para muitos, apenas uma mudança de quem detém o poder, não uma ampliação de direitos.
A financeirização da planta: cannabis como commodity
Com a entrada do cannabis nas bolsas de valores, ele se transforma de planta medicinal e espiritual em ativo financeiro. Isso gera consequências sérias:
- Produção em massa voltada ao lucro, e não ao bem-estar
- Homogeneização genética, perdendo-se diversidade cultural e botânica
- Exploração de mão-de-obra barata em plantações industriais
- Publicidade e consumo desenfreado em detrimento da educação e redução de danos
O risco é que o cannabis deixe de ser um instrumento de cuidado coletivo para se tornar apenas mais um produto no supermercado do capital.
A apropriação cultural no mercado canábico
Outro fenômeno comum é a apropriação de símbolos, linguagens e saberes originários por marcas que não pertencem às culturas que os produziram. Termos como “medicina ancestral”, “xamanismo”, “espiritualidade indígena” ou “herbologia afro” são usados para vender produtos de luxo, muitas vezes sem nenhuma conexão real com os povos que mantiveram vivo esse conhecimento.
Modelos alternativos de economia canábica
Apesar do avanço das corporações, existem iniciativas que propõem um outro caminho para a regulação:
- Cooperativas de cultivadores com base comunitária
- Bancos de sementes tradicionais geridos por povos originários
- Clubes sociais de cannabis sem fins lucrativos
- Projetos de autocultivo e distribuição solidária para pacientes
- Empresas éticas que incluem cláusulas de justiça social e equidade racial
Estes modelos mostram que é possível um mercado canábico centrado nas pessoas e não apenas no lucro.
Políticas públicas para democratizar os benefícios
Para garantir que a legalização beneficie amplamente a sociedade, é necessário:
- Criar cotas para licenças destinadas a populações afetadas pela proibição
- Destinar parte dos impostos do cannabis para educação, saúde mental e reintegração social
- Reduzir os custos e simplificar os processos de registro para pequenos produtores
- Proteger saberes tradicionais com marcos legais contra a biopirataria
- Estimular a formação de redes produtivas locais e sustentáveis
Sem redistribuição, não há justiça econômica possível.
Conclusão: cannabis para quem?
A pergunta que deve guiar toda política canábica é simples, mas poderosa: cannabis para quem? Para grandes empresas que buscam lucros? Ou para comunidades que resistiram à criminalização e construíram alternativas de cuidado, cultura e subsistência? A legalização só será completa quando seus frutos forem compartilhados com justiça, equidade e respeito à diversidade de quem sempre esteve ao lado da planta — e não apenas de sua rentabilidade.